Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes

09/11/2011 - Cultura
Obra de Cruz e Sousa inspira Casa das Ideias
Evento que acontece nesta quinta-feira (10/11), às 19h, na Casa da Memória de Florianópolis, reúne a escritora Eglê Malheiros e a pesquisadora Zahide Muzart em uma conversa sobre a vida e a obra do poeta simbolista catarinense

foto/divulgação:

Evento integra a programação em comemoração aos 150 anos de nascimento do poeta

Incompreendido por sua poética inovadora na antiga Desterro do século 19, atual Florianópolis, João da Cruz e Sousa transportou para os textos a genialidade e o sofrimento que marcaram sua curta existência. A vida e a obra do poeta que introduziu o Simbolismo no Brasil norteiam a conversa da escritora Eglê Malheiros e da pesquisadora Zahidé Muzart com o público, no evento “Cruz e Sousa do Desterro”, nesta quinta-feira (10/11), às 19h, na Casa da Memória, no Centro Histórico. A atividade, promovida pela Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes (FCFFC), integra a programação alusiva às comemorações dos 150 anos de nascimento do escritor catarinense.

 

Realizado dentro do projeto Casa das Ideias, o encontro cultural terá leitura de textos de Dennis Radünz e exibição fotográfica referente ao século 19, remetendo aos locais de memória de Cruz e Sousa citados em suas obras ou que fizeram parte do cotidiano do poeta no período em que ele morou em Desterro. As imagens integram o acervo de quase 23 mil fotografias sob guarda da Casa da Memória de Florianópolis. O evento tem entrada gratuita.

 

A agenda cultural do sesquicentenário está sob responsabilidade do Grupo de Articulação – 150 Anos do Nascimento do Poeta Cruz e Sousa, formado por instituições públicas federais, estaduais e municipais, além de organizações privadas e entidades não governamentais. O objetivo da iniciativa, coordenada pela Prefeitura de Florianópolis, é divulgar a poesia que imortalizou o escritor catarinense como o Cisne Negro da literatura, mas também oportunizar à população local redescobrir a trajetória deste conterrâneo ilustre que nasceu e morou na cidade boa parte de seus 36 anos de vida.

 

Vozes Veladas 

 

Natural de Tubarão(SC), Eglê Malheiros Miguel é bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e mestra em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É tradutora de obras literárias do inglês, francês, alemão, espanhol e italiano, tendo colaborado com as enciclopédias Delta-Larousse e Mirador.

 

Junto com o marido, o escritor Salim Miguel, Eglê Malheiros escreveu o roteiro e argumento de O Preço da Ilusão, primeiro longa-metragem realizado em Santa Catarina. Entre outros trabalhos, publicou o livro de poemas Manhã (Edições Sul, Fpolis, 1952), o livro infantil Desça Menino (Criar, Curitiba, 1985) e Os Meus Fantasmas (Ed. Movimento, Porto Alegre, 2002).

 

A escritora escreveu ainda diversos ensaios e críticas sobre Cruz e Souza, assim como a peça Vozes Veladas (Ed. Movimento, Porto Alegre), que conta a história trágica do poeta catarinense, que viveu na miséria e foi vítima de preconceito, e também retrata a história de uma sociedade excludente e racista. Com o texto, Eglê Malheiros conquistou em 1996 o prêmio da União Brasileira de Escritores (UBE-RJ) de melhor espetáculo, encenado na ocasião pelo grupo Pesquisa Teatro Novo, sob direção de Carmem Fossari.

 

Memória literária

 

Graduada em Letras Neolatinas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e em Música pela Escola de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Zahide Lupinacci Muzart é doutora em Letras pela Faculté des Lettres et Sciences Humaines, e tem pós-doutorado na Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales, ambas em Paris. Por mais de 20 anos lecionou nos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde continua atuando como orientadora de dissertações e como pesquisadora, com experiência na área de Letras, em especial Literatura Brasileira.

 

Ao longo da carreira, Zahide Muzart concentrou os estudos nas relações entre literatura e memória, com ênfase para temas ligados às mulheres e a escritores catarinenses, entre eles Cruz e Sousa, sobre quem escreveu vários textos. Foi organizadora também do romance D. Narcisa Vilar, e do livro Escritoras Brasileiras do Século XIX.

 

Integrou a equipe que elaborou o Portal Catarina, projeto de literatura digital da UFSC que recupera e organiza acervos de autores catarinenses dos séculos 19 e 20, disponibilizando uma série de conteúdos e de informações pela internet, gratuitamente,  para leitores e pesquisadores. Entre as obras que podem ser consultadas estão correspondências pessoais e exemplares do jornal O Moleque, editado por Cruz e Sousa, em Desterro.

 

Cisne Negro 

 

O mestre do simbolismo no Brasil nasceu em Desterro, em 24 de novembro de 1861, com o nome de João da Cruz. Negro, filho dos escravos alforriados Guilherme da Cruz e Carolina Eva Conceição, foi educado com zelo e esforço pelos pais, contando com apoio dos ex-senhores da família, o Marechal Guilherme Xavier de Sousa e sua esposa Clarinda, que deram ao menino o sobrenome.

 

Cruz e Sousa estudou no Ateneu Provincial Catarinense e, ainda jovem, aprendeu francês, latim e grego, dedicando-se também à matemática e às ciências naturais. Aos 20 anos ingressou no jornalismo e fundou pequenos jornais como o Colombo, O Moleque e a Tribuna Popular, junto com o escritor e amigo Virgílio Várzea, com quem publicou também o primeiro livro, em 1885, Tropos e Fantasias.

 

Enfrentando dificuldades financeiras, sofrimentos familiares e o preconceito da sociedade, o Cisne Negro (como era conhecido no meio literário) viveu uma espécie de exílio em sua terra natal.  Negro numa sociedade escravocrata, o escritor catarinense foi incompreendido por seus versos simbolistas e pela poética que o colocou ao lado da vanguarda francesa. Por sua obra inovadora foi rejeitado pela Academia Brasileira de Letras, além de ter sido muitas vezes acusado de indiferença à escravidão e de ter vergonha de ser negro. Por sua origem, foi recusado para ocupar o posto de promotor na província de Laguna.

 

Engajado nas lutas de seu tempo, e militando contra a escravatura, em favor do abolicionismo, Cruz e Sousa escreveu diversos artigos e poesias, e atuou em inúmeros jornais brasileiros, especialmente do Rio de Janeiro, para onde se mudou em 1890. Em fevereiro de 1893, publicou Missal (prosa poética) e no mesmo ano, em agosto, divulgou Broquéis (poesia), deflagrando o Simbolismo no Brasil e liderando um movimento de renovação literária que se estendeu até 1922.

 

Casado com Gavita Rosa Gonçalves, também negra, teve com ela quatro filhos, que morreram cedo vítimas da tuberculose. A doença também vitimou o escritor levando-o à morte em Minas Gerais, aos 36 anos de idade, em 19 de março de 1898. Com a publicação póstuma de várias obras de sua autoria, como os livros Evocações (1898, prosa), Faróis (1900, poesia) e Últimos Sonetos (1905, poesia), o Poeta do Simbolismo conquistou enfim o reconhecimento por sua poesia universal.

 

O corpo de Cruz e Sousa foi transportado para o Rio de Janeiro num vagão utilizado para o transporte de animais. O enterro, realizado no Cemitério de São Francisco Xavier, contou com a presença de poucos amigos, como José do Patrocínio, um dos destaques dos movimentos abolicionista e republicano. Em 2007, os restos mortais do escritor foram trasladados pelo Governo de Santa Catarina e estão hoje depositados no Museu Histórico de Santa Catarina – Palácio Cruz e Sousa, no “coração de Florianópolis”.

 


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